quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Floresta da Vida

Suponha a existência de imensa floresta
Onde a humanidade é planta rasteira.
As copas das mais altas árvores
Nos sugam a luz sorrateira.

Pois neste universo nem todos recebem
Dos raios solares a justa recompensa.
Há rosas que murcham na falta de luz
E estrume entre luz imensa.

Mas uma voz secreta em todos palpita
E solta as forças, sem alarido,
E todos se põe a crescer
Do galho de espinhos ao ramo florido:

“Vós todos bem sentis a ação secreta
Da natureza em seu governo eterno
E de ínfimas camadas subterrâneas
Da vida o indício à superfície emerge”.

É voz que brada de cima, capta
O ouvido que recebe a mensagem,
É a voz do próprio criador
Que se dirige à sua criadagem.

E quem é este escravo de Deus?
A planta rasteira de pouca luz!
De onde a voz vem, não se sabe,
Talvez de um forte, talvez duma cruz.


Daniel Pettri

domingo, 24 de agosto de 2008

WITHMANN

Ah! Withmann, gênio dos gênios
alma das almas do mundo
e do céu,
Tua poesia não precisa
não deve
não pode ser interpretada,
entendida
Pois tua amplitude é tal
que escapa aos domínios da razão,
Uma beleza tal fala por si mesma
Diretamente da coisa dita aos homens.

Tu não comentas as mães
és a própria geração
Tu estás em toda parte
Em todos os reinos e mundos
Crescendo junto as ervas.

Não preciso procurar-te,
Para todo lugar que olho,
Céu, terra e coração
Sinto tua presença viva.

Impossível fugir à tua presença
No âmago de todas as coisas
A tua alma imensa transpira
E para qualquer lugar que vá
Estarás lá à minha espera.

Te encontrarei no fim
E quando nasci te descobri,
E, passo a passo, te redescubro
Não só na borda da estrada
És o próprio caminho
e universo.


Daniel Pettri

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

ORGULHO

Orgulho delicioso, eu me esborro
Em ti me lambuso fartamente
O meu legado ao imutável doo
O meu presente ao cheio vôo
De não mudar jamais.

Enche,tarde, a enseada de paz,
Onde repousa, meiga, a natureza.
Mas só para mim eu olho!
Cúmulo do pouco e da avareza!

Voam as aves, às auras mansas
Entregam as asas, despreocupadas;
Eu fico preso ao chão que me retém, forçoso
De abraçar o céu e as alamedas.

Os ecos pela distância oca voam
E retribuo a esta saudação sonora
Um "bem dito" vago e pouco
Que julgo ouvir-se clamoroso.

Assim eu falo, pois tomei ciência
Do pouco que sou, sendo muito,
Em gesto de mesquinha benevolência.

Não há quem negue à flor grandiosidade
Porque conquista todos os seres,
Ao gracioso riacho transparência,
À humildade excelência,
Ao coração e à fé imensidade.

A estes muitos me julgo aumentado!
A estes poucos- infinitos que não se aumentam
Porque me fecho delirando

E assim, os mundos - poucos afugento!


Daniel Pettri

domingo, 17 de agosto de 2008

O TEMPO DOS AMANTES

O Tempo revoa, meus instantes morrem
A juventuda passa nas balsas da tarde,
E um velho acalanto em meu peito borda
Tristezas de outono, onde a primavera arde.

Navega, oh! balsa dos meus anos,
Vai pelas sendas do tempo sentida,
E busca nas cismas um lago de aromas,
E busca nos lábios um lago de vida.

Por quê foges, oh! tempo de alvorada?
Quando a hora e a luz se fazem mais risonhas!
Por quê partes assim em debandada
Tardes de amor, onde tristeza, sonhas?

A manhã dos meus anos é formosa e cara,
O olhar canta uma juventude em cada fronte
Quando vê passarem, lírios do infinito
As moças que em si resumem flórido horizonte.

A ternura dos meus lábios é só arminhos,
O frescor dos meus gestos é só louros,
Deixa eu coroar a tua fronte com meus beijos
E vestir o dia de teus cabelos douros.

Mas tudo passa... teus dias de menina
São uma tarde que fez-se moça
Ao murmur dos teus carinhos nesta boca
Nenhum dia falecido já remoça.

O tempo, esse falcão ousado
Rouba-nos tudo, juventude! amor! anelos!
Descerra sobre mim o cortinado
Da tenda oriental dos teus cabelos!

Que o tempo passe mas não custe a vida,
Que o dia morra mas não reine a treva,
Quero ficar contigo entre suspiros
Antes que os lírios morram porque neva.


Daniel Pettri