segunda-feira, 31 de março de 2008

Eflúvios do Amor

Todo um eflúvio de altas preces canta
Embalsamando o lírio de amor da garganta
Toda aurora noturna em ecos vai raiando
As orgias festivas dos amores constelando.

Doma o destino e perfaz o fado
O amor entre pares de luz festejado
O doce amor meigo, celeste, terno
Que vai bater aos umbrais do eterno.

O misterioso elo que une tantos entes
No vórtice caudaloso das nascentes
Vai em sacros ritos deflorando a esfera

Harmonia de amor erra de era em era
Compõe os buquês da formosa terra
E as lavas de luz das líricas torrentes.

O Sacerdócio do Bardo

Na calma vaga noturna se inquieta
A liríada, consagrada festa do poeta,
Ele convida os djins a bailar brando
Os amores nobres das esferas consagrando.

Ele abençoa as altas flamas seletas
Que apaziguam os ardores dos ascetas
Em sua voz nascem ecos de luas
Ecos de musas festejadas, nuas.

Voa, esculpe ao mundo estátua bela
Despreza os uivos da louca procela
E as perdas todas da existência incerta

Ele navega o barco santo das esferas
Ele soluça a aflição trágica das eras
Ele é o sacerdote, o inspirado poeta.

Consolações

Paz e arte: desdobra as rútilas asas
Voa acima do abismo-caos da existência;
Luta o mortal para domesticar o tempo
O pêndulo, cujo compasso exclama: “Agora
Hás de contorcer-te para encobrir o vazio
Do momento”.

Poema Filosófico

O desespero da morte no desespero da vida
Morrer e findar, sem rastro e sem continuidade.
Transformar-se em nulidade absoluta debaixo
Do escuro e fatal beco da cova, ah! Esse
Desespero é terrível, perante o desespero
De ser pobre e estar limitado pela pobreza
Ou ser rico e mesmo assim estar preso,
Perante as múltiplas formas de desespero
Da vida; é perante essa dura realidade
Que mentimos, acalentando risonhas esperanças,
Esperanças de ganhar na loteria, de ser amado
De encontrar a felicidade ou a glória dourada,
De cobrir-se de honras ou saciar-se de poder
Mais ai! Somos todos demasiadamente mesquinhos.
Queremos receber, mas raras vezes nos alegra dar
Vivemos regateando nossos dons orgulhosos
Como se fossemos bons demais para esse mundo
De borra, para esse mundo infeliz que não
Nos entende, não nos ama justamente, não
Oferece seus ouros e louros ao sagrado esforço.
Acalentamos esperanças que consolam, abrandando
O cerne do tempo que habitamos; não somos
Afinal bons demais para os outros, esses infernos?
São múltiplas as fomes insaciadas
Quem quisera conviver encontra o gelo
Quem quiser voar, o limite o fere
E há germes cruéis, miséria mais densa
Fomes mais cruentas, corações urrando
Lobos ferozes a devorar fetos de presas
Enquanto a maldade reclama o poderoso
Poucos são os que ousam saudar o dia
De coração puro e consciência acesa
E clamar: leva-me, rico caudal e harmonioso!
Antes queremos domar a indomável vida
Oh vida! Oh fera! Clamamos, tantas vezes
Fechados a partilhação dos múltiplos dons.
Antes, que a vida nos leve e assome
Sua florescência por todos os recessos do ser.
Louvar generosa e ilimitadamente a vida
Em comunhão, perante o extenso flagelo
Da morte: eis o meu secreto desejo.

domingo, 30 de março de 2008

Vênus Agraciada

Uma vez achadas as fontes
Pôs-se o rio a correr
Ao êxtase carnal as belas frontes
Aos elos recônditos o coração do ser

Assim, belos amantes descuidados
Sejamos sempre em pontes infinitas
Para a glória serena dos achados
Como ao consolo alto dos aflitos

E breve se verá naturalmente
Onde deságua a graça desses rios:
Canções carnais e êxtases celestes,
Hinos da terra, ledos e fugidios

E outros, desnudos de tredas vestes
Indo ao Arno revelar a transcendência
Amores que tem das auroras o estado
E dos anjos a sereníssima aparência

Pois a Vênus apraz o vivedor devoto
Sem ânsia e sem tremor, destes amores,
Tal da ciência de amor o manso voto
Na variedade multiamor das flores.

06/09/1999

quinta-feira, 20 de março de 2008

Contemplação das Imagens

Seria um fato claro ou tredo engano
Esse cortejo de sombras a incitar o poeta?
Abismal segredo encerra o lance humano
E no ouro ou no amor põe o mortal a meta.

Visões, amplas musas da inteligência seleta!
A vós evoco já, em gesto altivo, soberano,
Vinde desvendar o vosso celeste arcano
Na lira sonora que ecos seus marcheta.

O bardo ardente, convulso, emocionado
De receber o vosso abismal segredo
Se desfaz de enleio por vós, apaixonado.

Se a terra é engodo e a esfera um degredo
Ou se é verdade todo o mundo bordado
Tornai patente ao bardo no imortal folguedo.

O Vozerio Carnal

O vozerio carnal, rude, inclemente
Com grita voraz, tolda-nos o alto Arno
Ígnea canção do regateante fauno
Vende ao desejo o nobre e o inocente.

É toda prece do prazer rangente
O caldal da volúpia, o doudo afago
Da lascívia ancestral em gozo mago
Que vai tecendo o capro alegremente

Que assim trona o prazer doce e fluente.
E unidos no desejo audaz, secreto
Os entes rodopiam no êxtase concreto

Vão espasmando no delírio lento
Até que se esqueça do celeste ideal
Em convulsa lama o ser mortal.

O Ângelus da Felicidade

O templo vasto sagra a todo instante
Seu nobre Ângelus de safira e diamante
Os homens correm afoitos atráz da miragem
Mal gozam sôfregos a acolhedora estalagem.

Amantes do excelente e devotos da carnagem
Embala-os um cântico voraz, selvagem
A turba ignora o refrão transcendente
E vagamente sonha o verbo eternamente.

O melhor, o nobre, que contém felicidade
Não é buscado senão com libertinagem
E o puro afã boia de um sonho virgem.

O templo espelha a azul imensidade
Mas o mortal só quer na ansiedade
Gozar a festa vil em meio à vadiagem.

Bálsamo Sereno

Vozes suaves dos êxtases serenos
Surdinas de luz da natureza em festa
Paz primordial que o grande bem atesta
Dos carinhos de delírios supremos.

Ergue as asas aos líricos e extremos
Vinhos imortais do sol, alta luz mestra
Que os infinitos calmos e mansos amestra
E põe um lago nos corcéis terrenos.

Em meio à desventura e a desdita
Na luta imensa, convulcionada, aflita
Do pego dos desejos em tremenda guerra

A natureza é o albergue cuja dita
Consola a dor e a mágoa infinita
E acalma a ânsia que nas veias erra.

Canção dos Gestos

Vi duas sombras pálidas
E irmãs: o amor e o desejo
Se correr elas fogem
Se cruzar os braços elas vêm

Mas que dura sombra
me perssegue e alcança
Quando o ânimo cansa
a tristeza

Mas que incógnita moça
cheia de dor e promessa
cruza os braços e me espera
a morte

Vi duas sombras pálidas
que se fizeram ardentes
cruza os braços a tristeza
me persegue a morte

Estou feliz, cruzo os braços
E o amor mais sol
E o desejo mais penumbra
E a tarde mais tristeza... doce
E mais promessa a morte.

Luta Oposta

O abismo oposto
à tarde imensa
Solidão oposta
Ao bom gracejo

Escárneo oposto
ao rio do beijo
Medo oposto
ao mar aventuroso

Espreita a desgraça
a cega tristeza
Da dor nascem
heróicos bom-vivants

Pranto estreito
no horizonte
Coração ferido
no tempo

Abraça luz
o canto lúcido
mas turva morte
ri no teu não

A perder-me leva
a achar-me aqui
Além da escada
o chão celeste

Agora eterno
presente infindo
oposta boca
da tua ausência.

O Tesouro e o Ulcerado

Glaucos Horizontes! Ígneos faróis!
Harmonias de mundos e de sóis!
Belezas sem conta pela vasta esfera!
Segredos da alma e da atmosfera!

Quando volve o olhar acabrunhado
Pelo peso de preocupações o homem ulcerado
Nada encontra que lhe alegre o capricho?
Urra qual monstro, geme qual bicho.

Mesmo em meio aos riquíssimos tesouros
Todo engalanado de pompas e de ouros
O mísero mortal escuta a voz da cobiça
E com feroz orgulho faz mover-se a liça

Dos seus cuidados mil: trepa o céu; desce
Ao abismo; [em paroxismo altos tesouros tece
E do ardente amor renega a cara prece
Enquanto o egoísmo morde e entretece.

Glaucos horizontes e enternecidos céus
Raro lhe afagam enchamecidos escarcéus
Sua asa inata luta e então esquece
O mundo rico em paz que belezas enaltece.

A Saga do Coração

O nosso destino está atado à aquilo que amamos
Na presença ou ausência, no infinito, no limite
Do amor à sorte do jogo subordinado
Com êxtases abissais e átrios de segredo
Uns calmamente, outros tropeis de revolta
Por nosso amor seguimos a dor e o riso
De um caminho, e por modo nosso de amar
Ébrios ou isentos, aspergindo um nosso brilho
Atraímos o sonho mais reservado ao círculo do encanto.

Nossa luta não é outra, seres complexos,
Tudo permanece e afaga na velada essência
E somente o coração resta e sua história
E o sentimento transcendental pairando sobre a data
Imutável céu de amor sobre a experiência mundo.

O espírito peregrina ao incerto e em segredo
Oculta que ama o amor, o cálice da majestade,
O exuberante seio da harmonia, o triunfo
Magnificente da paz realizada nos ideais da aurora
Ou da noite, percorrendo perplexos a multiplicidade,
Só o coraçãoo que sabe, só o coracão que é bússola;
Ah! quiméricos becos forjados de momentos
O destino é desposar a pátria da beleza
Amar e morrer no rio da imensidade.

Momentos

Não almejo a profundidade do pranto
Ou sentir o denso vazio do tempo
Enquanto a chuva cai e a hora rói
O significado ingrato do lamento.

Vibre o sol em festa, entre amenas flores
Goze a hora, mesmo no muro do limite
Avante sempre, dentro do possível.

quarta-feira, 19 de março de 2008

Vozes do Silêncio

Rosamundo e Isadora conversam com a alma.
Seus olhos traçam painéis de verbos altos
Seus rostos de lirismo calam, contemplando
Fascinados, crianças que descobrem a manhã.
Suas mãos desenham os mais sutis pensamentos
Detalhes do mundo já segredam os dedos
Em cada mínimo gesto mudo soa a lira
O violoncelo do silêncio os espaços já afaga.

Nesse estado de paixão, suspensa em contemplação
O contentamento retira as palavras da pauta
Embebem -se os braços num luar fora de órbita
E com castanholas rumorejam bocas
O doce sussurro alento dos hálitos cúmplices.

Sussurra o vento morno pelos céus propícios
Nascem as folhas das palmeiras amplas
Brotam as ramas nos outeiros apartados
Despontam flores num missal de gentilezas
O sol desce aos mares em seu corcel de fogo
As estrelas se enamoram no colar do firmamento
E, sentinela do amor, a lua mata o tempo,
Se insinua na alcova celeste e muda aguarda.

Vêm os amantes secretos, hinos sem voz,
Dentro do peito as órbitas infinitas,
Paz sideral muda, triunfo de sons enlaça:
Ampla esfera silenciosa, alcova de sangue
Por oceanos requebrados de gemidos.

terça-feira, 18 de março de 2008

A Marcha Misteriosa

Arroja-te, novo tempo, conquista a eternidade
Pelas praias extensivas que o sol banha
Na face fresca do mundo, do aqui ao remoto,
Novos rostos bendizem o esplendor ancestral
Eis que o sangue da terra se renova.

Vamos, rosas da graça que perene vento afaga
Redescobrir os tesouros de eras imemoráveis
Quando tudo era incriado no promissor abismo:
O inefável encanto que sempiterno ao sol move
Selado na arca misteriosa do sempre.

Cumpri-vos também o desígnio do tempo
Realizai a tansição contínua e renovada
Em curta passagem albergai o sem data
Velha geração traz a vós a missão humana
Sujeita a temporais, certa do último porto
Reconquistai da primavera a sagrada aliança
Círculo infindável nas mananciais esferas.

Com misterioso amor, para a felicidade criados
Abraçai a luz no universo lúcido
Fundidos com a graça da secreta origem
Sus! Marchai para o fim a que estais predestinados
No seio harmonioso do alto, filhos do pó
O topo vos espera, marcha da humanidade.
Heróica procissão! Sublime marcha.

Harmonias da Natureza

Canta o albergue redentor da natureza
Sua prece santa, enleio de beleza
Afasta para o caos as horas loucas, mas
Em que canta a luta atroz, gume de Satanaz.

A verde paragem estua em lira veludosa
O enleio das douradas tardes, a preciosa
Luz do amor que cria, alenta, e a mordaz
Dor do ódio extingue em seio vivaz.

Prece de calma folia, glória sobre o sol
Aurora de amor que doma o pranto cruel
Espelho de prazer, fonte de preclaro mel.

Em tua voz de ermo o amor de fato
Canta, evoca o deus humano, e o ato
Da criação, consagrado no arrebol.

Paz e Amor

O verão forjou na carne o chamamento
Que da volúpia ousa evocar o amor,
Que ao ser devasso gera ímpeto e dispor
De amar com enternecido sentimento.

O amor e a paz! Renovadores do momento
Põe os anjos e os astros em nosso favor:
Tu és um deus, quando o amor ousas propor
Com altanado e dedicado pensamento.

O amor esculpe volúpias veludosas
A professar sobre o divã de rosas
Meigas auroras enternecidas, gratas.

A paz constela o azul de serenatas.
Paz e amor!Anjos e deuses celestes
Olimpo de luz que flamas vertes.

A Carne e a Luz

Que a carne, cujo desejo une e seduz
Em nossos corações acenda divina luz
E o momento de ouro ecoe a prece
Do rito pagão que em flamas amanhece.

Sê bondosa, bela dama, que amor traduz
Em pompas de pomos redondos, o bem produz
Anjos divinos no coração, e a carne conhece
Então, dos lírios do verão a flor precoce.

Amemos sobre a palheta incerta dos anos
O amor consola a dor, apaga os desenganos
Ele sabe de cor a lição dos ecos celestiais

Unge teu corpo sacro em prece de ais,
Esculpe o amor a carne da musa soberana
E seu olhar ao gosto dos falos se inflama.

A Distribuição do Amor

Ouve a voz do rouxinol, ousado vivedor
Assim ecoa o amor; rumemos à caçada
Pelos bares de volúpia da treva enluarada
Evocando o divino albergue do claro amor.

Quem canta põe Venus a seu favor
Louvemos os primores da beleza sagrada
São belas as prendas que a vida oferecida
Gratuitamente coloca ao lírico dispor.

Sim! Pomposas curvas de bela cavala
Deslumbrada a mirar a face masculina
Sensualidade em êxtase, musa felina,

A lua cabe no olhar do deslumbramento
A face em oásis de benção resvala
Eclode o paraíso da volúpia num momento.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Soneto de Amor e Veraneio

Louvemos da primavera a dádiva infinita
Do amor em flor a contínua renovação
A benção de esplendor na boca do verão
E da paixão a voz que fere e incita.

Louvemos do amor a prece transcendente
A graça tão suave, a poderosa benção
A sutil palpitação; a face sem paixão
É como a morte do sarcasmo repelente.

Louvemos! Que toda prece divinal da carne
Acenda do desejo o íntimo alarme
A par de Venus e seu mais sacro enleio.

Fundemos o gozar celeste desse louco veio
E cantemos loas ao unir do desejo ao charme
No sangue, na alma, no amor, na carne.

Maré do Desejo Amoroso

Toda uma floração de sensuais alardes
Pelos hinos, pelos poros da tua carne canta
A volúpia, que de ecos erradios se encanta
Tece em teu seio de mel líricos acordes.

Pompas de lua tesa, pela qual tu ardes
Peregrinos gestos de abandono que levanta
A prece acesa do falo, que em si decanta
Uma orgíaca aurora de amorosos lordes.

É a carne que em nós ri e que embrutece
O vasto mar da harmonia, louca prece
Se une aos idílicos acenos da tesa maré.

Vida, que unge, fere, agracia e é
Uma continua renovação do fatal desejo
E uma retração mortal após, dá-me teu beijo.

A Amizade

Quando a vontade de viver já nos falta
Quando a fé e o trabalho nos desampara
E não vemos na existência quaquer sentido
Por não termos ideais,
Quando todo alento enfim se foi
Desfeito pelos insucessos
Sobra ainda uma luz, um amparo,
Que os mares e os anos não separam
A que os homens chamam amizade.

Amizade é ajudar a quem desamparado
Não encontra alegrias e felicidade
À dor entrege, ao mal atirado
Só lamenta o passado com saudade
Acender no coração deste um sorrizo
Isso sim é a verdadeira amizade!

E os dias são tão longos, tão sofridos
Quando não se tem na vida amigos,
Mas as tardes se aquecem e inflamam
Ao contato deste convívio
Que até aos mais gelados homens
Costuma inflamar, a amizade!!!

Corrupta Invernada

Por horas perdidas numa rua distante
Vagava a sós, anelante peregrino,
O céu de chumbo, precipício desolante,
Continha o anátema negro do destino.

Tudo em lamas vestia o caminho
Ânsias animais no ar se fundindo
Ao perfume doce e vago do carinho
As ventas suspirosas iam me abrindo.

Tu não te lembras, meu amor pretérito
Dos versos de Baudelaire, que decantavam
Com valor sublimado de cantar emérito
As doces volúpias que de horror matavam?

Ou então, recorda-te daquele tédio
Plasmado ao vício lasso da corrupção
Onde as prostitutas já sem remédio
Ofereciam lassivas o exausto coração?

Pois bem, era por mundos libertinos
Em meio ao lodo, ao asco perfumoso
Que eu errava em teus olhos cristalinos
Fluindo em castelos sensuais de gozo.

E era como se meu belo trajeto
Unindo meu pranto ao teu sorriso
Num envolvimento sólido e abjeto
Abrisse estradas de lodo e granizo.

Pois tu, minha bela invernada
Onde me acasala o suspirar da dor
És a urna vaga e imaculada
Das horas perdidas no lodo e no amor.

Os Jardins de Eva.

Fitava Eva indolente os seus jardins
Devaneando volúpias perfumosas
A alegre graça dos sobores afins
A professar sobre o divã das rosas.

Pagens, devotos carnais ou querubins
Enchendo o silêncio de ecos maviosos
Imitavam domadores langorosos
Servindo a fera com carícias e assins.

A bela espreguiçou sobre os despojos
E tão rica sofreu sua atroz miséria
Destino fatal dos seres desejosos.

Entre risos dados fácil fez-se séria
Toda essa paixão, homens sediciosos
Nem sempre vale paraísos amorosos.

Segredantes Vozes

Voam ao Arno as segredantes vozes
Do amor universal que aos entes dá guarida
Corcéis de luz cujos ímpetos vivazes
São o vinho e o pão no missal da vida.

Ouve-as o poeta em transe inspirado
O amante encontrado... perdido em doudo afã
Raia sobre o mundo, esplendorosa manhã
Lava o erro e o cruel engano perpetrado.

Desde a Ode de Schiller ao olímpico brado
Anseia-te o ideal das seletas almas
Colher louros de amor e douradas palmas
Sobre o instante de revelações constelado.

Fere o mundo presente, é carcere, é degredo
É lamento atroz em meio a turbilhão de treva
O sarcasmo viça porque o egoísmo medra
E morre a flor no desamparo e no degrêdo.

Sucumbem os romantismos ao vozerio carnal
Tantos louvam a vantagem no intestino do mal
Oh, surge! Augusta aurora do sublime ideal
Irmana os lumes! Extasia-nos teu fanal!!!

Contudo segue a matéria, bruta, voraz galope
Sua necessidade é tremenda! Se alteia atroz!
É essa necessidade que eleva e abate
Que cala os djins e dá as pedras voz.

Canção de Maio

Os teus cabelos são negros ninhos de garça
São pátrias também... serenos e suaves,
Ao sopro das brisas que o verão incita
São leves poetisas em vôos de aves.

O teu olhar... negra colméia esquiva
Dos pélagos velados do coração
Tem ninhos... moradas de astros
Além das tendas do rijo tufão.

O teu suspiro em trinados de anjo
Canta a terra e exalta os céus...
Silvo ardente que o luar perpassa
E vem dormir junto aos anelos meus.

O teu sorriso pela fronte esparsso
Geme, afoito, preces de alegria
Ah! Que hinos de horizontes largos
No lago azul da fantasia.

Teu rosto ideal de beleza clara
Refulge como um céu de constelações
Embebe os rios de minha ternura
Em lumes de sutis palpitações.

Tu, mulher...que o anelo me prendeste
Nos teus viçosos lábios cantantes
Dá-me beijos como sonhos
Pelas asas de noites suspirantes.

Tardes Púrpuras

Amo as translúcidas tardes de fogo
Em que a saudade canta, pássaro erradio
E, preso as solares melancolias poentes
Envolve a terra com seu hino vadio.

As constelações de prata e de granito
Refulgem ao fundo nessa hora sagrada
Em que as asas de safira do infinito
Brilham quais rubis em tela magoada.

As urnas ardentes dos amores orvalhados
Pelo afeto que de lágrimas se tinge
Lançam pelos ares purpúreos brocados
De toda espectativa secular que os aflige.

Como um demônio a natureza reza
A sua missa de prantos e tristeza
Nobre alma afeita ao choro e a profundeza
Pulsa em mim nesta tarde de beleza.

Nos orgasmos tardios de um mundo diluido
Em broquéis, espumas e dolências vagas
Ferve o meu coração nostálgico e entretido
Na larva nascente das Grandes Dores Amargas.

Amo as tardes diamantinas e espasmadas
Deitadas sobre o leito cândido e vaporoso
As tardes de ouro, preciosas, são amadas
Por mim num suspiro manso e afetuoso.

Soneto da Messe

Doces sonhos tão intimamente anelados
Sonha a humanidade, e quão cruel é o dia
Que lhe nega a esperança, que dor sombria
Ante a luz tão parca em êxtases sagrados.

Tem meu destino se composto de mil cuidados
Ousadia no amor, sorte no jogo, e a erradia
Flama não alberga tudo o que a voz alicia
Em termos de volúpias e de achados.

Hoje sinto de amor a esperança repleta
E de igual enleio repleta a vasta esfera
Prodígios incessantes gera o ventre da terra!

Trocava por amor a hora mais seleta
Da solidão a paz, o albergue soberbo
Do verso belo onde consolos bebo.

Mulher Moderna

Vibra o amor pela tua carne, estátua
De pomposo esplendor, hino de juventude
Amar-te assim é albergue de beatitude
Na plenitude sensual duma sonata.

Não há em ti senão o desejo que acata
Mulher moderna! O olhar doce de infinitude
A oferta de volúpia que Venus desata
E o eco do desvario e da mansitude.

Suave anjo dado ao gozo carnaval
Bela escultura grata ao paladar ideal
Que em curvas se perfaz e se renova

Oh! que verão de amor ou luxúria, tua cova
E sobre a andança peregrina da carnagem
O verso eloqüente ousa cantar-te selvagem.

Castelos do Amor

Prova o sal e o sol da canção apaixonada
Doce idílio enlaça o par em azul comoção
Gládio do amor, celeste gládio de paixão
Alta comunhão sobre a vertente enluarada.

Uma divina paz raia após lírica estada
Unge-a em teu peito enleado em comoção
Oferta a ventura essa paz de compreenção
Nao precisas reinar, não desejas mais nada.

Oh! felicidade amorosa, teu nobre sólio
Os anjos comove, o deus tem como espólio
Que lucidez para o futuro apaixonado!

Constrói teu castelo a dois, transfigurado
De emoção celeste vai então seguindo
A harmonia das esferas brandamente ouvindo.

domingo, 16 de março de 2008

O Veleiro Lindo (de Daniel Pettri)

A paz que afaga nossa tarde ardente
Desnuda o rosto virginal da amante,
Sensível ternura lânguida e cantante
Afeita ao bem, carinho transcendente.

Pureza meiga, espelho do levante,
Melhor afeto e generoso e amante
Qual um poema que une o par instante
Em tom menor de cismas docemente.

Veleiro harmonioso, alegre e triste,
Heróico e brando, a vaga cativaste
Ao som do oceano que jamais termina,

E após, ao doce olor da sombra dos coqueiros
Dormir do azul aos mais mornos brazeiros
Na boca do teu sono, oh! alma peregrina.